segunda-feira, 29 de agosto de 2022

lama

hoje chove

o dia inteiro

o gosto de fim 

não é amargo nem doce


é terroso


o quanto uma pessoa pode se deixar enganar?


lá fui eu de novo

até os ratinhos aprendem a não voltar quando levam choque


quantas vezes eu preciso doer suas verdades?


todo meu corpo endurecido

assombrações por todos os lados 

o coração ainda mole

diante desse amor soterrado


quanto de lama é preciso para encobrir os anos mais felizes das nossas vidas?


a sorte me sopra devagar  

como quem esfria uma sopa pra dar de comer a quem se ama.




terça-feira, 31 de maio de 2022

vai escoar

trabalhei em novas lembranças

e agora elas me engolem ainda viva

a sensação de impotência 

tentar tocar em uma nuvem na esperança de ser feito algodão

eu que fui tanto até você, mas nada pode te alcançar

eu não posso te alcançar

vou embora ignorando a sua presença

você não sabe o que é amor

e eu que sei tanto

e eu que quis tanto o seu

amor

preferir estar sozinha do que comigo é uma enchente no meu peito

a água vai escoar.

segunda-feira, 18 de abril de 2022

eu não paro de pensar no incrível

não consigo fazer nada 
além de pensar em tudo

descobri:
dedos que advinham o peso certo pra me fazer chover
gestos-gentileza que aquecem meu corpo inteiro
textura boa de tocar

eu que não toco, faria música em você

palavras certeiras, bobeiras, presença

você disse que te deixo nervosa
quero ser terremoto outra vez.

domingo, 10 de abril de 2022

amanhã é segunda

Sinto mais saudades nos domingos 

em que não danço

ou que não durmo

em que me desocupo

o contrário da leveza

a ausência pesa mais que um corpo

e deita sobre mim

eu respiro, eu me viro, eu dou meu jeito

amanhã é segunda, eu vou me distrair.


segunda-feira, 4 de abril de 2022

 


eu vou tirar do meu corpo todas as lembranças

e fazer uma grande fogueira que chamarei de adeus

para assim poder aproveitar plenamente o agora

sem resquícios de você 

em outras peles que me enrosco e não são a sua

sem resquícios de você 

em outras línguas que danço e não é a sua coreografia

sem resquícios de você 

em outras águas que não as do seu leito.


aos poucos

não vai sobrar nada de você 

no meu amar.

segunda-feira, 28 de março de 2022

Não ficar já é partida

Eu revisito você, ainda.

Eu preciso ouvir você dizer que acabou.

Novamente.

Ouvir repetidamente você dizer que acabou.

Até que acabe.

Eu preciso das palavras saindo da sua boca.

Eu preciso da sua boca

me dizendo adeus.

Até que o adeus chegue de vez e me faça um cafuné.

Não o seu. 

Nunca mais 

o seu cafuné.

Não basta saber que você ama outra,

não basta entender a partir das suas entrelinhas,

não basta não ter você aqui.

Eu preciso de toda essa voz que você me nega.

Eu preciso colocar uma escuta no teu coração.

Eu preciso que suas mãos peguem delicadamente o meu amor,

e que diante dele, suas lágrimas caiam, num banho de ternura

e você beije demoradamente cada parte

e se despeça com a certeza de ida.

Eu preciso da certeza de ida, eu vou buscar.


Qual é o meu lugar na sua vida?
Nem você sabe ou finge não saber.
Qual é o tamanho dessa saudade?
Tão curta que logo passa.

Eu não sou mais alguém para quem você faz impossíveis, 
logo eu, viciada em ir atrás do meu desejo
logo eu, tranquei a porta do meu quarto e engoli a chave
pra me proteger do risco de ir até você.


quarta-feira, 16 de março de 2022

Aqui e agora

Aqui, nesse lugar repleto de ontem, eu me permito chorar esse adeus.

As palavras permanecem, apesar de tudo. Elas, que nunca me abandonam, me fazem lembrar de tudo que se foi e era tão bonito. De tudo que já foi eterno um dia. De tudo que parecia tão especial e se acabou ordinariamente. 

Esse olhar que era tão meu. Esse carinho que era tão da minha pele. Essas declarações surpresas que invadiam os meus dias, tão minhas. Esse fazer de tudo pra me ver. Esse chegar na minha casa de madrugada. Esse estar na minha vida inteiramente. Essas piadas que eram tão pra mim. 

E agora é tudo dela.

Por aqui, ainda leio suas palavras doces vindas da eternidade de tantos anos atrás.

Vai passar. Mas as palavras permanecerão. Eu tatuo a minha história no tempo, eu escrevo.